24 de outubro de 2016
Economistas defendem que auxílio-doença seja pago com impostos
A população começa a acordar para o assunto reforma da Previdência, agora que o governo está prestes a mandar para o Congresso projeto que vai limitar as regras de acesso à aposentadoria. É um assunto que costuma despertar muita paixão, pois mexe com a vida de todos, e em um momento em que se espera aumento da vulnerabilidade. Entre especialistas e economistas, não é diferente: as discussões são acirradas.
Há os que consideram a mudança do sistema uma necessidade urgente. O argumento central é que a população está envelhecendo e o governo destina cada vez mais recursos para pagar as aposentadorias e pensões, gerando deficit no Orçamento da União. Entre os expoentes dessa vertente, está Leonardo Rolim, consultor de Orçamento da Câmara Federal e ex-secretário de Política da Previdência Social.
Outros dizem que a previdência pertence à área de seguridade social, que inclui receitas e despesas da saúde e assistência social. Sob esse ponto de vista, há superavit nas contas. Existem, ainda, os que defendem a separação das contribuições dos trabalhadores urbanos do resto da seguridade. É o caso do economista Carlos Eduardo Freitas, consultor e ex-diretor do Banco Central (BC). Ele diz que as aposentadorias por tempo de contribuição integram um primeiro grupo, sustentável, já que respondem por dois terços da arrecadação do regime e 27% das despesas. O segundo grupo inclui seguros como auxílio-doença, acidente de trabalho e aposentadoria por invalidez.
Na terceira classificação, estão programas assistenciais, como a aposentadoria por idade. Freitas sugere que os aposentados do sistema rural sejam incluídos nesse grupo. “Essa parte de seguros deveria ser terceirizada. O trabalhador pagaria 4% (do que recebe) para a aposentadoria e 4%, para seguros. Com isso poderia reduzir a contribuição do empregador de 20% para 8% e, consequentemente, reduzir o custo de gerar emprego”, defende.
Descompasso
Para Freitas, o trabalhador de empresas privadas paga muito mais do que recebe, porque estão pagando a assistência social. “O que se propõe é destacar o componente assistencial, transferi-lo para o financiamento da sociedade como um todo, via tributos (impostos e contribuições). Essa conduta parece mais de acordo com os princípios da boa teoria econômica do que onerar um grupo específico de pessoas (os empregados formalizados). Eu gostaria muito que o governo mostrasse os números da Previdência que não fecham”, cobra.
Para Rolim, a compartimentação dos gastos deturpa a discussão. “Brasileiro gosta de esconder deficit dizendo que o Benefício de Prestação Continuada (BPC) não é previdência, e sim assistência. Em todo lugar do mundo, é previdência. O Chile teve que reverter a decisão da privatização dos seguros porque a velhice no país estava desamparada depois da privatização”, contesta.
“Seguridade é sinônimo de previdência. A reforma precisa ser feita. Na avaliação do mercado, em meados de 2028, o Brasil não terá mais como rolar a dívida pública. Ninguém vai emprestar para o país pagar as suas despesas e qual é a principal? A Previdência. Vai ter calote, vai ser uma crise sem fim”, prevê.
O secretário de acompanhamento econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto Almeida, está entre os que veem equívoco nas teses de que a previdência é superavitária. “Mesmo se deixássemos de lado a previdência e olhássemos apenas para o conceito mais amplo de seguridade social, isso não mudaria o fato que, até 2060, pelas regras atuais, a despesa com previdência crescerá perto de 10 pontos do PIB: R$ 680 bilhões. Seria preciso aumentar a carga tributária em pelo menos 10 pontos do PIB para fazer frente a isso”, afirma.
Soluções mágicas
“Uma boa forma de começar o debate é olhando para os números. Infelizmente, as pessoas com soluções mágicas parecem não conhecer os dados”, emenda Mansueto. Sem uma reforma da previdência, portanto, os brasileiros terão que pagar cada vez mais impostos apenas para honrar o compromisso de pagar aposentadorias e pensões de todos. “E, em 2060, seremos o país que mais gasta no mundo com previdência como percentual do PIB”, acrescenta.
A coordenadora de pós-graduação da Pontíficia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Melissa Folmann, conta que, cada vez que lhe perguntam sobre o deficit ou superavit da Previdência, ela responde que depende da análise que as pessoas fazem. “Se for do ponto de vista constitucional, não há deficit, porque se leva em conta os descontos com os benefícios fraudados, com as isenções e perdões de grandes devedores. Já os economistas defendem o deficit porque, se o dinheiro não entra na conta, não é contabilizado, portanto, falta”, explica.
Rolim frisa que a reforma é inevitável. “O atual regime da Previdência é uma pirâmide: os mais antigos se deram bem, os que estão no meio vão se virar, mas os novos, os que entraram no mercado de trabalho há pouco tempo, esses vão tomar o calote. Isso já começou e vai piorar muito”, adverte.
Fonte: Correio Braziliense
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