5 de junho de 2006

Após um ano, Lei de Falências apresenta deficiências fiscais

Após um ano, Lei de Falências apresenta deficiências fiscais
Paulo Gustavo Martins    
 
A nova Lei de Falências, que entrou em vigor em junho de 2005, completa um ano esta semana. Especialistas apontam o grande avanço trazido por essa legislação para a recuperação das empresas, principalmente por meio da negociação direta com os credores; contudo, também apontam problemas no próprio texto legal e na sua aplicação.
A principal reclamação apresentada diz respeito à relação das empresas em recuperação com o fisco, pois há na lei a exigência de apresentação de Certidão Negativa de Débito (CND) para o juiz aceitar o processo, sem que a norma prevendo o parcelamento dos débitos tributários tenha sido regulamentada. Outra questão destacada pelos advogados é o não cumprimento dos prazos legais no processo de recuperação. Além disso, há a questão da sucessão do passivo tributário e trabalhista na venda de parte dos ativos, ponto que ainda deverá ser esclarecido pela jurisprudência. Mais uma deficiência mencionada é a aplicação da lei pelos juízes de fora dos grandes centros urbanos, os quais permanecem na mentalidade da lei anterior.
“A recuperação passou a ser vista como uma alternativa pelas empresas em dificuldades”, diz Francisco Müssnich, sócio do Barbosa, Müssnich & Aragão . Entretanto, ele ressalva que a legislação fiscal não acompanhou o avanço dessa norma, dando causa a dificuldades na relação com as autoridades fiscais.
No mesmo sentido, Luiz Fernando Valente de Paiva, sócio do Pinheiro Neto Advogados , afirma que a grande deficiência da lei está em sua área tributária.“A empresa pode negociar com todos seus credores, menos com o fisco”, argumenta.
A pesar disso, Paiva diz que já estão surgindo precedentes importantes, citando o exemplo do processo de recuperação da empresa Stampafare Embalagens Flexíveis , em Jundiaí. Segundo ele, a empresa introduziu no plano de recuperação um conceito novo, o tratamento dos credores de forma diferenciada. “Na lei antiga todos os credores deveriam ter o mesmo tratamento; já a nova lei flexibilizou isso, permitindo o pagamento com prazo, forma e garantias distintas entre eles”. O juiz homologou o plano, mesmo com pedidos de impugnação por parte de credores descontentes.
Müssnich afirma que um ponto que não está muito claro no texto legal diz respeito à sucessão dos débitos trabalhistas e fiscais. Quando é realizada a venda de parte dos ativos de uma empresa em recuperação surge a dúvida sobre a destinação daqueles débitos, se eles “seguiriam” a parte vendida. A primeira resposta a essa questão deverá vir no processo da Varig, em que há a proposta de dividir a empresa em duas, sendo a parte de operações internacionais vendida sem débitos, com o remanescente da companhia respondendo pelas dívidas.
Para Fernando Nees, do escritório Martinelli Advocacia Empresarial , há certos dispositivos na lei que contrariam seus princípios, como a exigência de apresentação da CND antes da homologação do plano ou a conversão do processo de concordata em recuperação judicial, que é vedada pela Lei de Falências. Contudo, em razão de ser um procedimento mais benéfico para as empresas, ele diz que os juízes têm autorizado a conversão.
Murilo da Silva Freire, do Leite, Tosto e Barros Advogados Associados , afirma que os processos correm sem sobressaltos no Município de São Paulo, pois há duas varas e uma Câmara do Tribunal de Justiça (TJ) especializadas em recuperação e falências, integradas por juízes que conhecem a fundo a nova lei e auxiliares treinados para preencherem todas as formalidades processuais. Entretanto, ele diz que no interior de São Paulo a situação está mais complicada, pois os juízes ainda não se adaptaram à nova legislação, agindo como se estivessem sob a vigência da lei anterior, de forma lenta e burocrática.
Segundo dados do TJ, desde que entrou em vigor, em junho do ano passado, até o dia 30 de abril último, as varas de falência na capital receberam 1.042 pedidos de falência, 16 autofalências, 49 de recuperação judicial e decretaram 165 falências. A Câmara Especial de Falências e Recuperações Judiciais desde a sua instalação, julgou 347 recursos contra decisões que o juiz profere durante o curso do processo e 1.830 recursos sobre a sentença final.
Freire aponta também que os prazos legais não estão sendo observados. Há a previsão de que, durante um período de 180 dias após a aprovação da recuperação, os credores não podem mover ações contra a empresa devedora, para que os dois lados possam negociar. Freire diz, porém, que há casos em que tal prazo já foi superado e não chegou a ser convocada a Assembléia de Credores.
Fábio Astrauskas, diretor da Siegen , empresa de consultoria especializada na recuperação de empresas em crise financeira, diz que os ritos processuais resultam na morosidade. Isso dificultaria o cumprimento dos prazos, que acabam sendo flexibilizados.
 
Fonte: DCI/SP(05/06)

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