10 de janeiro de 2006
TSE põe a Receita nas eleições
Até mesmo os cabos eleitorais estão sob a mira das novas armas do Tribunal Superior Eleitoral para combater o caixa 2 nas próximas eleições. Entregues ontem ao presidente do TSE, ministro Carlos Velloso, sob a forma de dois atos normativos e uma minuta de resolução, as propostas prevêem que toda a contabilidade eleitoral dos candidatos, partidos, doadores, fornecedores e prestadores de serviço seja declarada e passe também pelo crivo da Receita Federal. Hoje, Velloso assina a portaria que coloca a Receita participando das eleições. E, até o dia 5 de março, os ministros do TSE devem apreciar 68 artigos que mudam as regras das prestações de contas em campanhas.
“São normas que vão dificultar o banditismo do caixa 2. Só não vamos acabar porque o espírito do estelionatário é extremamente criativo”, afirma Velloso, que recebeu as propostas das mãos do ex-secretário da Receita Everardo Maciel e do ex-juiz eleitoral Fernando Neves. Ambos fazem parte da comissão que desde setembro prepara medidas para dificultar ao máximo a prática de usar em campanhas recursos não declarados.
Para flagrar irregularidades, os juristas se agarram nas ferramentas do fisco. Quem ganha e quem recebe dinheiro com campanha será obrigado a declarar no Imposto de Renda. “Se José da Silva recebe dinheiro para deixar pintar o muro de casa com o nome do candidato ou para distribuir santinho pelas ruas, deverá registrar na declaração de Imposto de Renda. Além de declarar o valor gasto, o candidato ou o partido só poderá pagar com cheque nominal ou transferência eletrônica. Saques em dinheiro serão proibidos”, avisa Everardo Maciel, convencido que, com as medidas, será mais fácil rastrear de onde sai e para onde vai o dinheiro.
Visibilidade
Cada comitê pode ser obrigado ainda a manter Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) próprio e uma conta corrente exclusiva para a movimentação do dinheiro de campanha. Para deixar a contabilidade mais visível ao eleitor, os partidos e os candidatos precisam encaminhar quinzenalmente informações sobre receita e despesa de campanha. “Estamos convocando a sociedade a nos auxiliar na tomada de contas dos partidos políticos”, explica o presidente do TSE.
O novo pacote de medidas, que ainda dependem da aprovação dos ministros do TSE, pode colocar fim a uma desculpa incorporada por diferentes políticos envolvidos na crise. Responsabilizar o tesoureiro de campanha ou o assessor pelo uso do caixa 2 não terá mais respaldo jurídico. “O candidato é sempre responsável”, avisa Velloso, ponderando que esse é um dos itens que mostram o lado positivo da crise política em que o Brasil está mergulhado.
As punições para quem infringe a legislação, contudo, ainda não são tão imediatas quanto se gostaria. “As sanções são as previstas em lei. Se atrasar a prestação de contas ou deixar de declarar, o candidato pode ter a conta rejeitada”, observa Fernando Neves, lembrando que cabe então ao Ministério Público mover uma ação e impedir a diplomação do candidato vencedor.
Armas contra o caixa 2
Novas propostas apresentadas ao TSE para as próximas eleições
Doações de campanha
Todas as contribuições feitas aos candidatos terão de ser notificadas nas declarações de Imposto de Renda. A nova exigência valerá para pessoas físicas e jurídicas.
Cabos eleitorais
Quem recebe dinheiro para deixar o nome do candidato estampado no muro de casa ou para distribuir folhetos pela cidade também vai precisar declarar o valor na declaração de Imposto de Renda.
Saques bancários
Serão proibidos os saques em dinheiro, feitos na boca do caixa. Saque sapenas via transferência eletrônica (internet) ou mediante emissão de cheques nominais. Cada comitê vai ser obrigado ainda a manter Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) próprio e uma conta corrente exclusiva para a movimentação do dinheiro de campanha.
Arrecadação e gastos
Os comitês de campanha terão de informar, de 15 em 15 dias ao TSE receitas e despesas. As informações serão divulgadas na página do tribunal na internet. Quem descumprir a norma terá a conta bancária imediatamente bloqueada.
Formulário na Receita
Será criado um novo formulário da Receita Federal exclusivo a todos fornecedores de materiais de campanha ou prestadores de serviço aos candidatos. Na declaração de Imposto de Renda, serão necessários especificar datas, características do material e do serviço, bem como valores e números de notas fiscais.
Fisco
Para suprir as deficiências da Justiça Eleitoral, no final da eleição a Receita vai avaliar a prestação de contas em busca de empresas doadoras inativas, pessoas físicas cujo CPF não existe mais, doações acima do limite, etc. Detectado algum indício de irregularidade, a fiscalização se estenderá à sede dos comitês de campanha e das empresas que com eles se relacionarem.
De olho nos gastos
O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirmou que a regulamentação proposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) “é o primeiro passo, uma medida preliminar”, mas acrescentou que “o essencial não foi focalizado”. Para o senador, que investiga esquemas de caixa 2 na CPI dos Correios, o fundamental é que todas as ações apresentadas durante o processo eleitoral sejam julgadas antes da diplomação dos eleitos. “Não podemos gerar a falsa expectativa de que estamos criando uma fórmula para impedir o caixa 2. Mais do que de leis, precisamos de eficiência administrativa e gerencial da Justiça”.
“Defendemos todo o rigor possível na legislação, mas também é preciso instrumentalizar a Justiça para que as ações sejam julgadas em tempo”, disse o senador.
Para o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, não basta acompanhar a receita numa eleição. “É preciso controlar com rigor os gastos dos partidos e dos candidatos numa campanha. Para dar igualdade aos partidos, sejam eles grandes ou pequenos, é necessário que se limite os gastos”, sugere Lupi. Presidente de um partido que dificilmente consegue atrair gordas doações, ele pondera, no entanto, que as medidas propostas ao TSE são um bom começo: “O tribunal tem se mostrado preocupado com o processo de financiamento de campanha. Isso é ótimo, mas não é suficiente”, observa.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto (SP), que renunciou ao mandato de deputado após admitir que recebeu doações no sistema de caixa 2, disse que a proposta do TSE não surpreende. “Não nos surpreendeu, e está de acordo com as nossas convicções. O PL já havia solicitado, no ano passado, a fiscalização das contas do partido”.
Marketing da “pobreza”
Rudolfo Lago
Da equipe do Correio
Não vai bastar ser pobre. “A grande jogada de marketing na eleição deste ano será fazer a campanha parecer a mais pobre possível”, prevê o publicitário André Torreta. Mais do que efetivamente gastar pouco, os candidatos farão questão de apresentar programas espartanos, franciscanos. “Quem será louco de passar a impressão de que recebeu muito dinheiro, de que pode ter caixa 2 na campanha?”, indaga Torreta.
Assim como a discussão da ética será o tema dominante nos discursos da campanha, também será ela quem definirá a estética dos programas eleitorais. Assim entende também o cientista político José Luciano Dias. Para ele, não só os partidos vão buscar fazer campanhas mais simples como haverá também uma disposição menor dos doadores de campanha. Os empresários vão pensar duas vezes antes de se arriscar a ver seus nomes envolvidos em algum escândalo político.
Isso não significará, porém, a eliminação da figura do marqueteiro da campanha eleitoral. “O que vai acabar é essa idéia equivocada de que marqueteiro é quem ganha eleição”, comenta Luciano. Para ele, porém, o perfil do profissional a ser buscado nas campanhas mudará um pouco. Mais importante que o publicitário capaz de fazer o comercial mais bonito, o tipo de marqueteiro que o mercado político procura é aquele mais especializado na análise da conjuntura. Que lê as entrelinhas das pesquisas eleitorais. Observa tendências. Opiniões que vão se consolidando. Valores buscados. Expectativas buscadas pelos eleitores. Função que exerce, por exemplo, Antônio Lavareda para o PFL.
Objetivos
“Até nem tanto pela crise ética. Mas essa é uma tendência de profissionalização”, diz José Luciano Dias. Ela também se verifica nas eleições nos Estados Unidos e na Europa. A busca de uma campanha mais baseada em dados objetivos e científicos e menos no mero feeling dos candidatos, na linha do que o prefeito do Rio, Cesar Maia, do PFL, fez nas suas duas campanhas vitoriosas na cidade. Luciano observa que isso é, inclusive, um dado de economia. “Quanto mais segurança se tem da linha em que se investe, menos se gastará na campanha. Muito mais caro é fazer uma campanha que tenha de mudar de rumo e de tom no meio”, observa ele.
André Torreta concorda em parte. De fato, os partidos buscam cada vez mais o auxílio dos profissionais que podem ajudar na formulação do conteúdo, a partir da leitura mais correta das pesquisas qualitativas. Mas, mesmo numa campanha barata, a forma continuará sendo importante. “E quem dá a forma é o publicitário”, considera. “A gente vive num país de 170 milhões de pessoas”, continua. “Não dá para chegar a essa multidão se não for pela televisão”. Torreta só lamenta pela imagem que ficou da crise para os profissionais. “A gente está sofrendo por causa de um cara da área que botou os pés pelas mãos quando justamente deixou de fazer publicidade para se meter em outras coisas”, protesta.
O calendário do TSE
1º de abril
Prazo final de desincompatibilização dos titulares de cargos executivos que pretendam disputar outros cargos (por exemplo, prefeitos e governadores que queiram disputar a Presidência)
10 de junho
Início do prazo para a realização de convenções destinadas a escolher candidatos (a presidente, governador, senador, deputado)
e definir as coligações
30 de junho
Último dia para a realização de convenções para escolher os candidatos e definir as coligações
5 de julho
Último dia para a apresentação na Justiça Eleitoral, do requerimento de registro de candidatos
6 de julho
Data a partir da qual será permitida a realização de comícios e o uso da propaganda eleitoral por meio de alto-falantes ou amplificadores de voz em veículos
19 de julho
Último dia para os partidos políticos registrarem os comitês financeiros na Justiça Eleitoral
1º de agosto
Data a partir da qual é vedado às emissoras de rádio e TV transmitir programa apresentado ou comentado por candidato
15 de agosto
Início da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão
28 de setembro
Último dia da propaganda no rádio e na TV. Fim do prazo para a realização de debates e comícios
1º de outubro
1º turno das eleições
De olho nos gastos
O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirmou que a regulamentação proposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) “é o primeiro passo, uma medida preliminar”, mas acrescentou que “o essencial não foi focalizado”. Para o senador, que investiga esquemas de caixa 2 na CPI dos Correios, o fundamental é que todas as ações apresentadas durante o processo eleitoral sejam julgadas antes da diplomação dos eleitos. “Não podemos gerar a falsa expectativa de que estamos criando uma fórmula para impedir o caixa 2. Mais do que de leis, precisamos de eficiência administrativa e gerencial da Justiça”.
“Defendemos todo o rigor possível na legislação, mas também é preciso instrumentalizar a Justiça para que as ações sejam julgadas em tempo”, disse o senador.
Para o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, não basta acompanhar a receita numa eleição. “É preciso controlar com rigor os gastos dos partidos e dos candidatos numa campanha. Para dar igualdade aos partidos, sejam eles grandes ou pequenos, é necessário que se limite os gastos”, sugere Lupi. Presidente de um partido que dificilmente consegue atrair gordas doações, ele pondera, no entanto, que as medidas propostas ao TSE são um bom começo: “O tribunal tem se mostrado preocupado com o processo de financiamento de campanha. Isso é ótimo, mas não é suficiente”, observa.
O presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto (SP), que renunciou ao mandato de deputado após admitir que recebeu doações no sistema de caixa 2, disse que a proposta do TSE não surpreende. “Não nos surpreendeu, e está de acordo com as nossas convicções. O PL já havia solicitado, no ano passado, a fiscalização das contas do partido”.
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