1 de novembro de 2005

Superávit recorde antecipa meta

Apolítica fiscal restritiva, combinada com sucessivos recordes na arrecadação de tributos, permitiu ao governo superar ainda em setembro a meta de superávit primário de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto das riquezas produzidas no país) fixada para o ano. O setor público consolidado — União, estados, municípios e estatais — registrou naquele mês superávit primário (receitas menos despesas, sem contar os juros da dívida) de R$ 7,571 bilhões, elevando para R$ 86,502 bilhões (6,1% do PIB) o resultado acumulado no ano.


O superávit primário é a economia que o governo faz para pagar os juros da dívida pública do país. O chefe do Departamento Econômico do Banco Central (BC), Altamir Lopes, lembra que no fim do ano os gastos do governo são maiores.


— O resultado permite acumular até o fim do ano uma sobra de R$ 1,2 bilhão por mês, o que é uma poupança saudável — disse Altamir.


Entretanto, os números divulgados ontem pelo BC reforçam a percepção dos analistas de que o superávit primário do setor público fechará este ano bem acima da meta fixada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).


Com o resultado recorde de setembro, o superávit fiscal acumulado já supera em R$ 3,752 bilhões a meta estabelecida para o ano, que caiu para R$ 82,750 bilhões com a revisão da previsão de avanço do PIB de 4% para 3,4%. Em 12 meses, o superávit acumulado equivale a 5,16% do PIB.


— Mantida a sazonalidade das despesas públicas, tudo indica que fecharemos o ano com um superávit de 5% do PIB — prevê o economista Julio Sérgio de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).


No ano, gastos com juros já chegam a R$ 120 bilhões


Em relação ao mesmo período do ano passado, houve um crescimento de 23,9% no superávit consolidado do setor público, uma economia adicional de R$ 16,7 bilhões para o pagamento de juros.


O superávit primário de 6,1% do PIB nas contas públicas é o resultado combinado de um aumento substancial na arrecadação de tributos com os cortes de investimentos no Orçamento da União. De um lado, de janeiro a setembro a arrecadação já supera em R$ 14,3 bilhões o resultado do mesmo período de 2004.


De outro, a equipe econômica conduz com mão-de-ferro a execução do Orçamento de 2005, retendo no caixa do Tesouro a maior parte dos recursos para investimentos aprovada pelo Congresso. Até setembro, apenas R$ 2,9 bilhões ou 13,5% do total desses investimentos (R$ 21,6 bilhões) foram executados. Mesmo considerando os limites de gastos para investimentos liberados pela área econômica (R$ 13,6 bilhões), a execução ainda está muito baixa. Neste caso, corresponde a 21,5%.


As despesas com juros, por sua vez, continuam crescendo e provocando grande impacto nas contas e na dívida pública. O esforço fiscal de R$ 7,571 bilhões em setembro não foi suficiente para cobrir as despesas com juros, de R$ 14,461 bilhões. Com isso, o setor público teve déficit nominal (receitas menos despesas, incluindo os gastos com juros) de R$ 6,891 bilhões em setembro, que já chega a R$ 33,647 bilhões (2,37% do PIB) no acumulado de 2005.


No ano, os gastos com juros já chegam a R$ 120,149 bilhões, o equivalente a 8,47% do PIB. Em comparação com o mesmo período de 2004, essas despesas cresceram R$ 24,8 bilhões por causa da política monetária restritiva do BC, que elevou as taxas para conter a inflação. Entre janeiro e setembro de 2004, a taxa básica de juros média foi de 16,72% ao ano, enquanto no mesmo período de 2005 foi de 18,68%.


— O que separa a atual política monetária da política que muitos economistas consideram possível são esses R$ 25 bilhões a mais nas despesas com juros. Com esses recursos poderíamos fazer muitas coisas na área de infra-estrutura ou na redução da carga tributária — diz o diretor do Iedi.


Palocci nega conflito interno do governo sobre política fiscal


Em setembro, a maior contribuição para o superávit do setor público foi dada pelo governo central (Tesouro Nacional, Banco Central e INSS), com uma economia de R$ 2,930 bilhões, mas o esforço das estatais também merece destaque. Elas registraram superávit de R$ 2,903 bilhões, enquanto estados e municípios registraram superávit de R$ 1,737 bilhão.


Já a dívida líquida do setor público acumulada até setembro está em R$ 973 bilhões, equivalente a 51,4% do PIB. Houve uma queda em relação a agosto (51,8%), mas o chefe do Departamento Econômico do BC destacou que o impacto da elevação dos juros ainda não foi totalmente incorporado à dívida:


— A estimativa do BC é que chegaremos ao fim do ano com uma dívida equivalente a 51,5% do PIB.


O ministro da Fazenda, Antonio Palocci, negou ontem que haja no governo um conflito entre uma área mais desenvolvimentista, liderada pela ministra Dilma Rousseff, e outra mais centrada ao rigor monetário e fiscal. Segundo ele, a proposta do Planejamento para as metas fiscais de longo prazo é um desafio maior, que trouxe um novo debate ao governo. Perguntado sobre a existência de pressões por um afrouxamento do controle da inflação — Dilma disse não ver problema em se ter 15% de inflação desde que o governo pudesse investir mais — Palocci foi diplomático:


— O que há é uma conclusão de que o esforço das políticas monetária e fiscal para controlar a inflação deu resultado. É hora de consolidar essa conquista e andar para a frente, não questioná-la. Se não, você joga fora o esforço feito.
COLABOROU Ronaldo D’Ercole

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