23 de setembro de 2013
O leão quer (muito) mais
Por Cláudio GRADILONE e Cristiano ZAIA
Os contribuintes levaram dois sustos na terça-feira 17. No Congresso, os parlamentares da base aliada preservaram o veto da presidenta Dilma Rousseff ao fim da multa adicional de 10% sobre o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), cobrada dos empregadores em caso de demissão sem justa causa. Já a Receita Federal divulgou a extensa Instrução Normativa 1.397, que aumentou o trabalho contábil e os riscos de cobrança para as empresas. A nova Instrução trouxe algo que já era esperado: a necessidade de as empresas prepararem demonstrativos contábeis seguindo dois métodos diferentes. Mas também veio com um susto: a possibilidade de tributar retroativamente resultados distribuídos aos sócios como dividendos (que são isentos de imposto) a partir de 2009.
É o Leão afiando suas presas e esticando suas garras num momento em que o governo precisa reforçar o caixa. No caso do FGTS, o que está em jogo é uma bolada de R$ 3,6 bilhões somente neste ano. Criada em 2001, a multa adicional destinava-se a tapar um buraco de R$ 42 bilhões no FGTS causado pelo próprio governo, com os planos econômicos Verão (1989) e Collor I (1990). Apesar de o próprio Ministério da Fazenda ter informado, em fevereiro, que o rombo havia sido coberto, o Executivo enviou um projeto de lei horas antes da votação, vinculando esses recursos ao programa Minha Casa Minha Vida.
“O governo não se planejou pensando que a multa ia acabar”, afirmou o secretário-executivo da Fazenda, Dyogo Oliveira, ao explicar por que esses recursos são necessários ao orçamento deste ano. A fatura dessa imprudência será paga pelas empresas. Já a Instrução Normativa esclareceu diversos pontos cinzentos do Regime Tributário de Transição (RTT), estabelecido em 2009, e que ditava as diferenças entre os registros contábeis que seguem os padrões internacionais, o chamado IRFS, e a maneira como a Receita calculava os custos das empresas. A Receita resolveu as diferenças da maneira menos trabalhosa para ela própria, obrigando as empresas a manter dois registros contábeis, um gerencial e outro fiscal – um absurdo que só eleva o famigerado Custo Brasil, num momento em que o País precisa de mais confiança dos investidores para crescer.
Multa mantida: o Congresso votou, na terça-feira 17, a manutenção do adicional de 10% do FGTS para compensar a falta de planejamento do governo.
“Isso vai aumentar o trabalho dos empresários e os gastos com contadores, informática e sistemas”, diz o advogado paulista Rubens Vellosa, do escritório Vellosa e Girotto. Assusta o fato de que a nova exigência pode significar mordidas inesperadas no caixa das empresas. Segundo Paulo Marinho, sócio do escritório de advocacia mineiro Junqueira de Carvalho e Murgel, as empresas vinham calculando a remuneração de seus acionistas com base no lucro contábil. Parte ou todo esse lucro é distribuído como dividendos, que são isentos de imposto. “Ao estabelecer um cálculo específico, a Receita pode entender que o lucro fiscal é menor do que o contábil”, diz Marinho. “A Receita pode tributar esses rendimentos.” Pode e vai.
“Quem distribuiu dividendos e serviu-se da isenção fiscal acima do previsto terá de pagar imposto, retroativamente a 2009”, diz Iágaro Jung Martins, sub-secretário interino de fiscalização da Receita. E tem mais: pelo IFRS, as empresas determinam a depreciação de máquinas e veículos, segundo as condições de uso. Já a Instrução estabelece o prazo tradicional de cinco anos. Isso pode aumentar o custo de empresas com grandes frotas de caminhões. Outro ponto sensível são as amortizações de ágio entre as empresas. “O planejamento tributário, em que o contribuinte inventa estruturas jurídicas que só existem no papel para pagar menos imposto, está com os dias contados”, ameaça Martins. Ele garante que quem não deve não precisa temer. “Não posso cobrar mais do que as empresas devem, não posso inventar autuações”, diz. Provavelmente, com dor no coração.
Colaborou: Denize Bacoccina
Fonte: Isto É Dinheiro
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